24.3.11

O Lixo “é nosso!”/ Trash “is ours”!

O Lixo “é nosso! “/ Trash “is ours”!

No Brasil, é muito comum ouvir a frase de efeito “[insira algo privatizado aqui] é nosso(a)!” para recursos que a população considera valioso e que ela acredita ser de certa forma “dono” daquilo, apesar de não poder vender, trocar nem usufruir daquele recurso. Terra, água, petróleo, minério e a Amazônia todos já preencheram essa lacuna. No caso, estas pessoas querem que todos tenham os mesmos direitos para decidir o que será feito com aquele recurso. Porém, sendo “de todos” ao mesmo tempo, nunca entendi que critério seria usado para a alocação sem que haja preços, já que sabemos que é impossível um representante eleito tomar uma decisão representando realmente a vontade de todos.

O lixo, atualmente, é “nosso”: é papel do estado, normalmente na forma dos departamentos de limpeza urbana municipais, fazer a coleta e dar um destino ao lixo. Em Porto Alegre, a cobrança do serviço de coleta de lixo é manifestada através da Taxa de Coleta de Lixo (TCL), calculada a partir de um coeficiente multiplicador do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU). Tanto o IPTU como o coeficiente multiplicador são definidos a partir do tamanho, do uso e do material de construção da edificação. O que estes critérios usados têm a ver com a quantidade de lixo produzido? Ao que me parece, muito pouco. A definição da taxa (como qualquer definição de preço a partir do poder público) também não tem nenhuma relação com o custo real da coleta e da destinação do lixo, já que o preço é algo inerente ao comércio e às trocas, e não é algo que pode ser arbitrado por um legislador.

Então, se existe um recurso sendo usado a um preço mais baixo do que ele deveria ser, temos um grande incentivo financeiro para utilizar mais dele quando não deveríamos, provocando o que chamamos de desperdício. Se ele for usado a um preço mais alto do que deveria ser, também teremos desperdício, porém não daquele recurso natural, mas de tempo ou esforço para economizar aquele recurso natural que talvez não valha a pena ser economizado. Agora, ao colocar determinado recurso natural no mercado, o sistema de preços se encarrega de distruibui-lo a quem mais valoriza tal recurso em cada momento, sendo utilizado em um ponto mais próximo do ótimo.

Sendo assim, existe um bias (ou “viés”) que faz com que algumas pessoas gritem para que determinado recurso não seja privatizado, pois elas não entendem que este recurso será utilizado de forma mais eficiente caso sua distribuição seja feita pelos preços e não pela política. O que comprova que esse bias é, afinal, um bias, é que não vemos uma opinião popular a favor estatização do lixo com a mesma intensidade quando a sua privatização entra em debate. Afinal, as pessoas querem se livrar do lixo, e não ser donas dele.

Com o sistema público, a coleta e destinação do lixo também pode ser considerada um monopólio, já que não há competição e poder de escolha entre serviços concorrentes. Isso faz com que não exista incentivos para a melhora do serviço, com inovações ou redução de custos. Com um sistema privado os custos hoje carregados pelo estado poderiam ser cortados automaticamente sem perda de empregos, já que os mesmos funcionários poderiam muito bem trabalhar para empresas: afinal, eles têm o conhecimento específico adquirido por trabalhar naquela profissão por um bom tempo.

Se o lixo não fosse “nosso” mas pudesse ser coletado pela empresa que a gente escolher, a empresa tentaria fazer uma cobrança mais de acordo com a quantidade de lixo realmente coletada, já que isso representa seu custo, fazendo também com que qualquer desperdício do recurso afetasse diretamente o bolso do cidadão. Estas empresas também estariam sempre procurando o melhor destino possível para cada material que ela recolhesse, já que ela precisa lucrar com lixo, incentivando cada vez mais a reciclagem de materiais cujo custo compensa ser reciclado. Vale lembrar não estou dizendo que tais empresas possam simplesmente jogar o lixo no mar, queima o lixo sem piedade ou permitir que o lixo infiltre o solo de terrenos vizinhos: a justiça e as regras contra a poluição excessiva devem ser iguais para todos, independente do seu ramo de trabalho.

Alguns podem dizer: "Bom, mas algumas pessoas mais pobres não teriam condições de pagar pela taxa de lixo que hoje é subsidiada pela Prefeitura!". Minha primeira resposta é: porque incentivar alguém a desperdiçar, independente da sua renda ou classe social? Estatísticas também mostram que a tendência é de quanto menor a renda, menos lixo é produzido, já que o consumo também é reduzido.

Então quem quiser que o lixo continue “nosso” deve ter em mente que o desperdício também continuará sendo nosso.

Foto: Lixão municipal a céu aberto em Porto Alegre. Fonte: mafiadolixo.com

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In Brazil it is very common to hear people saying “[insert something that was privatized here] is ours!” for resources that people consider valuable and believe they “own” it, despite not being able to sell, trade or enjoy it in any way. Land, water, oil, minerals and the Amazon have all filled this blank space. What happens is that people want everyone to have the same rights over deciding what should be done with that resource. However, being everyone’s property at the same time, I never understood what criteria would be used for allocation without prices, as we know it is impossible for an elected representative to actually take a decision respecting everyone’s desires.

Trash today “is ours”: it is the state’s job to collect and give trash a destination. In Porto Alegre charging for waste is taken place in form of the Waste Collection Fee (TCL), measured with a multiplier of the Urban Building and Land Property Tax (IPTU). The IPTU and the multiplier are set from each building’s size, use and the material from which it is made of. What do these criteria used have to do with the quantity of trash produced? From what I see, very little. The definition of the TCL (as any other price definition by government) also has no relation to the actual cost of waste collection and disposal, as pricing is inherent to commence and trade and is not something that can be arbitrated by a legislator.

If resources are being used at a price lower that it should be, we have a large financial incentive to use more of it than we should, creating what we call waste. If they are being used at a price higher that is should be, we also have waste: not of that resource, but of time and energy spent to save something that is probably not worth saving. Now, when putting a certain resource in the market, the price system is in charge of distributing it to whoever most values that resource in each moment, being used at a point much closer to optimal.

So there is a bias that makes people shout for certain resources to be privatized as they don’t understand that this resource will be better used if its distribution is made through prices and not through politics. What proves that this bias is, in fact, a bias, is that we don’t see public opinion going as crazy as with other resources when its privatization is in debate. After all, people want to get rid of trash, and not own it.

With the system being public, the service of collecting and disposing trash can also be considered a monopoly, as there is no competition and no choice between competing services. What happens is that there are no incentives for the service to get better, with innovations and cost reductions. With a private system costs that are today a burden for the state could be automatically cut with no job losses: after all, they have the specific knowledge acquired by working on the job for quite a while.

If trash was not “ours” but could be collected by any company we choose, the company would try to charge accordingly with the amount of trash produced as it represents its expenses, also making any waste of resources directly damage the citizens’ pocket. These companies would also always be looking for the best destination possible for each material they collected, as they must profit from trash, incentivizing recycling of materials which are worth recycling. It is also worth remembering that I’m not saying these companies could simply throw its trash in the ocean, burn it mercilessly or allow it to infiltrate its neighbor’s land: justice and rules against pollution should apply equally to all, no matter who we’re talking about.

Some might say: well, but some poor people would not afford to pay for the trash that is currently subsidized by City Hall! My first reply to that is: why incentivize someone to waste resources, independently from her paycheck or social status? Also, trends show that the lower the income the smaller amount of trash is produced, as consumption is also reduced.

So whoever wants trash to remain “ours” must be aware that waste will also remain ours.

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