19.2.13

O que há de errado entre o CAU e o Sindicato dos Arquitetos

Assim como algumas outras dezenas de milhares de arquitetos pelo país, recebi alguns dias atrás um e-mail do Sindicato dos Arquitetos. Achei estranho já que nunca fui atrás de sindicato algum nem cadastrei meu e-mail em nada relacionado à tal atividade. Ingenuamente (e apenas por curiosidade) fui ler o que o Sindicato me informava.

Baixando a barra de rolagem, um aviso (grifos meus):
"O pagamento da contribuição sindical, previsto no art. 579 da CLT, é obrigatório para todos os Arquitetos e Urbanistas, trabalhadores autônomos ou funcionários, que atuam na profissão. Trata-se de um tributo federal cujos valores são repartidos entre o Ministério do Trabalho e Emprego e as entidades sindicais. O Ministério do Trabalho e Emprego utiliza o recurso para o Fundo de Amparo ao Trabalhador e o Seguro Desemprego. Já as entidades sindicais utilizam um percentual da arrecadação para prosseguir com as ações em defesa dos direitos e interesses da categoria, como, por exemplo, a luta por melhorias salariais, as campanhas de esclarecimento da população acerca das atribuições dos Arquitetos e Urbanistas, etc. Para ter conhecimento das ações do SAERGS no ano de 2012, acesse o site do Sindicato.
Portanto, garanta o pagamento da contribuição sindical até o dia 20 de fevereiro. Esta é a data limite para pagar o tributo com o valor de R$ 132,00. Até o dia 28 de fevereiro, o valor da contribuição será equivalente a R$ 173,00. O não pagamento pode implicar na suspensão do exercício profissional junto ao CAU."
O boleto chegou logo na minha casa.

Fiquei surpreso já que não assinei este serviço de defesa dos meus interesses, até mesmo porque eles não parecem estar fazendo absolutamente nada para isso. Eu nem mesmo sou funcionário para que "defendam meu salário" - tenho empresa e presto serviço de arquitetura. Aliás, daqui a pouco eu mesmo posso ter funcionários! Mesmo se eu fosse um funcionário, eu jamais gostaria de buscar brechas legais para obrigar as pessoas a me pagarem mais ao invés de buscar melhorar minha capacitação junto ao mercado de trabalho, fazendo com que a demanda pelo meu trabalho aumentasse naturalmente. Mas nada disso importa e serei obrigado a contribuir.
"Deve ser recolhida para um Sindicato, de sua livre escolha" -
exceto diferente do Sindicato dos Arquitetos

Se eu não me sinto representado pelo Sindicato, também não tenho liberdade de criar um outro sindicato para concorrer contra ele: o Sindicato dos Arquitetos funciona para a classe como um todo, e devo obrigatoriamente tentar mudar a estrutura monopolista atual por dentro para provocar qualquer transformação. O boleto ainda cita que somos "livres para escolher o Sindicato", porém infelizmente a minha "classe" é apenas uma. Quando entro no site do SAERGS para obter mais informações (quem sabe eu participo dessa coisa?), uma outra surpresa: não há informação alguma sobre meus "benefícios" ou como me associar, apesar de o site ter postagens desde janeiro de 2011.

O valor que deve ser pago corresponde a apenas um dia trabalho. Se já trabalhamos cerca de 150 só para pagar impostos, 151 não faz muita diferença, faz? Na realidade, segundo o Presidente do TST, "criar sindicato é um dos negócios mais rentáveis do país". Isso explica os constantes aumentos da "base salarial" da profissão, que não é aplicada em lugar algum do país e serve apenas para aumentar a taxa de contribuição anual obrigatória para a entidade.

Desconcertadas como eu, inúmeras pessoas me perguntaram sobre esta cobrança, ao vivo e pelo Facebook, com medo de perderem suas licenças junto ao CAU. Mas a ameaça é simples e fácil de comprovar: ao entrar no site do CAU-RS eles nos lembram: "Fevereiro é o mês de pagamento da Contribuição Sindical". Mas espera, o que o CAU tem a ver com o Sindicato dos Arquitetos?

Eu já tinha suspeitado desta estranha relação de intimidade entre o Conselho de Arquitetura e Urbanismo e o Sindicato quando eles se instalaram temporariamente na sede do Sindicato ao estabelecerem o CAU, mas foi incrível ver que a minha não-contribuição ao Sindicato implicaria na perda do meu registro profissional. Ou seja, a regra estabelece que se eu não quero que os "meus direitos" sejam protegidos pelo Sindicato não sou capacitado para projetar edificações (?).

Desde que acompanho a atuação do CREA e a formação do atual CAU, os arquitetos e urbanistas envolvidos fazem questão de dizer que a entidade não serve para proteger os interesses da classe, mas sim de "orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de arquitetura e urbanismo, zelar pela fiel observância dos princípios de ética e disciplina da classe em todo o território nacional, bem como pugnar pelo aperfeiçoamento do exercício da arquitetura e urbanismo". Apesar das minhas constantes críticas e desconfianças de que os objetivos eram outros, desta vez fica bastante claro que o CAU trabalha sim em aliança com o Sindicato, auxiliando-o a exercer a sua função.

Independente das minhas críticas ao Conselho, este que colocaria na cadeia grande parte dos melhores arquitetos do Brasil e o mundo, além de outros prejuízos sociais que ele normalmente cria, esta postagem não trata diretamente deste assunto, mas explicita como a organização funciona e como os motivos usados para justificá-la são deturpados. Utilizando o site como palco de discussões, gostaria de ver pontos diferentes às minhas observações, não em relação à maneira utópica do papel que o Sindicato e o Conselho deveriam exercer, mas da maneira como eles funcionam na realidade brasileira. Caso eu tenha me equivocado em algum item acima, também peço para que me alertem para que este seja corrigido.

12 comentários:

  1. Como é permitido uma palhaçada dessas?? Isso é extorsão clara.
    "Ou me da teu dinheiro ou tu não pode mais trabalhar nesse país"

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  2. Caros colegas,

    Ao que me parece, o tal sindicato aproveitou a criação dos CAU para abocanhar aumento em suas receitas.
    Também percebo que nem todos os CAU sofreram o Lobby necessário do Sindicato para cobrar. O Sindicato esqueceu de pagar um Coffee Break para o Diretor do CAU de Piau, então, vejam só o que deu:
    http://novo.caupi.org.br/?p=3221

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  3. Vivemos em um estado democrático regido por leis. O conselho existe para regulamentar a profissão, uma das exigências ao profissional é que esteja em dia com o seu sindicato. Para se manteres existe a contribuição tanto sindical como conselho. Todas as regras são aprovadas em leis, todas as taxas encaminhada para seus fins. Como é o caso do seguro desemprego entre outros. O que acho que os profissionais deveria fazer é se aproximar mais das entidades de classe e acompanhar bem as atividades, se estão cumprindo com a lei e fazer sua contribuição. Como podemos ser representados sem um conselho e um sindicato? Fim a questão.

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    1. Denis, maioria da sua argumentação pelo CAU/Sindicato é o fato de eles estarem aprovados em leis. No entanto, leis não estabelecem o que é certo e errado, e na minha opinião quase a totalidade das leis desse país ora são contraproducentes por si só ora deveriam ser corrigidas.

      Quanto à minha representatividade: uma coisa é você achar importante a representatividade e pagar voluntariamente uma taxa associativa. Vejo isso de forma extremamente produtiva para a profissão. No entanto, se eu não acho importante ou acho que o serviço fornecido tanto pelo Conselho ou pelo Sindicato irrelevante ou ineficiente, sou obrigado a pagar mesmo assim. Não vejo como isso pode ser considerado justo ou produtivo para a profissão, apesar de escrito em lei.

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    2. Concordo com o Anthony. Sou arquiteta e estou desempregada há quase um ano. Já tive que me desdobrar de mil maneiras para pagar o CAU e, de repente, recebi a carta do Sindicato com um boleto. Estou pagando para ter o direito de ser arquiteta? Quer dizer, se eu, desempregada, não puder pagar todo esses impostos, perco o direito de exercer a profissão na qual me formei (e que custou muito caro concluir)?
      Outra questão é: eles querem lutar por um salário justo. O Sindicato já provém um piso salarial muito justo que, se não me engano, é de 8,5 salários mínimos. Mas onde estão as empresas que pagam esse piso? Se conhecerem, estou precisando de uma!

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    3. KKKKKK, que lindo, o sindicato e o Conselho de classe estão preocupados com nossa profissão. KKKK. A pergunta é, isso interessa a mim? A você? A quem?
      Amigos, isto é o Brasil

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  4. O Sindicato juntamente com outras entidades como a FNA, IAB e outras tiveram papel decisivo para a criação do CAU, quando formaram o Colégio Brasileiro de Arquitetos. Então é fácil entender esta "boa" relação entre eles.
    Embora eu receba o boleto do Sindicato muito antes da criação do CAU, meus dados foram repassados para eles pelo CREA.
    Precisa é acabar com este famigerada "contribuição obrigatória" para os Sindicatos e eles é que trabalhem para conseguir associados.

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  5. Os sindicatos no Brasil são criação do presidente Getúlio Vargas nos anos 1930, com base na Carta del Lavoro do Partido Fascista Italiano de Benito Mussolini. Foram criados em oposição aos comunistas, que queriam a estatização das empresas brasileiras. As lideranças sindicais tinham a finalidade de justificar e legalizar lideranças (pelegos) de operários e/ou empregados junto aos oligopólios (grandes empresas ou cartéis sem concorrentes) dominantes (grandes usineiros e grandes empresários financiados pelos bancos estatais). A justificar o "Capitalismo de Estado" dos tempos de Getulio, também a Justiça do Trabalho" (que não existe mais em parte alguma do mundo, pois nos Estados Unidos, por exemplo, quando patrão não paga é possível uma queixa comum numa delegacia de polícia). Sindicato é portanto criação de uma legislação fascista. Não tem a menor relação com ideologias da Esquerda.

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  6. ILEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL OBRIGATÓRIA. (Artigo de), Francisco das C. Lima Filho. (Para ler o artigo completo vá ao link: http://www.pelegrino.com.br/doutrina/ver/descricao/194)

    A edição da Lei 11.648, de 31.03.08 que trata do “reconhecimento formal das centrais sindicais” com a alteração dos arts. 589, 590, 591 e 593 da CLT que disciplinam a distribuição da “contribuição sindical”, que na verdade não passa de um “imposto”, trouxe de volta o debate sobre a legitimidade constitucional desse resquício do corporativismo sindical, [...] representa do que um dos resquícios do modelo sindical corporativo importado do regime fascista italiano onde ele era cobrado sob a denominação contributo sindicale [...].

    Tais questões (Justiça do Trabalho, Sindicalismo no Brasil) exigem um Facebook{...].

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  7. Quem registra empresa no Simples Federal é isento da contribuição sindical. Ver o artigo: “SIMPLES MANTÉM ISENÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO SINDICAL” no link: http://www.portaltributario.com.br/noticias/isencao_simples.htm

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  8. A invocação do art. 599 da CLT não favorece a pretensão do SAERGS.
    Dita disposição, que tem sua redação originária do tempo do regime ditatorial do
    Estado Novo, não encontra guarida no regime democrático implantado com a
    Constituição de 1988.

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  9. Ainda não conheci nenhum sindicato que prestasse para alguma coisa que não fosse um cabide de empregos e indicações de "colegas", taí mais um...a gente só sabe da existência dele no boleto. É uma vergonha, até em uma profissão que deveria ser baseada na liberdade e vanguardismo de diversas maneiras, sermos achacados por uma prática desse tipo. Não pago e não pagarei nunca essa obrigatoriedade absurda com a qual não compactuo. Eles deveriam ir trabalhar que nem gente.

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