17.12.12

Depardieu e os europeus votam com os pés

Uma das principais liberdades que uma pessoa pode ter é a de sair do lugar que não a agrada mais. Se o seu aluguel aumentou demais, se você mudou para um emprego muito longe, se uma oportunidade de trabalho apareceu em outra cidade ou se a sua cidade não lhe oferece trabalho algum, você sempre pode tentar se mudar. Local é uma das coisas mais difíceis de trocar, já que nos enraizamos com famílias, carreiras e amigos. Mas é de se perceber que com o passar do tempo estas coisas estão cada vez mais acessíveis à distância: é cada vez mais barato viajar, cada vez mais fácil se comunicar à distância e cada vez mais nossas carreiras profissionais são menos permanentes e mais flexíveis.

Esse processo de escolha leva à competição entre bairros, cidades, estados e nações por habitantes, uma forma cada vez mais relevante para obrigar nossos políticos a escolherem regras atraentes para seus cidadãos. Por incrível que pareça, ao mudarmos de local estamos sendo grandes contribuintes para que ele melhore. Isso recentemente foi traduzido na vida real com a fuga da população das cidades européias, como mostrado no gráfico abaixo divulgado no início do mês no Atlantic Cities.


Um dos principais atores (literalmente) dessa emigração em massa foi Gérard Depardieu, cineasta francês que, ao transferir sua nacionalidade para a Bélgica para pagar menos impostos, foi chamado de "patético" pelo primeiro ministro. Como resposta, Depardieu escreveu uma carta aberta publicada ontem no Le Journal du Dimanche, um certo manifesto à sua emigração que resolvi traduzir como um respeitável exemplo dessa atitude:
Patético, você disse "patético?" Como é patético!

Nasci em 1948, comecei a trabalhar aos quatorze como impressor, como trabalhador manual e depois como artista de teatro. Sempre paguei meus impostos independente das taxas sob todos os governos passados.

Em momento algum falhei nos meus deveres. Os filmes históricos nos quais participei provam meu amor à França e à sua história.

Pessoas mais ilustres que eu foram expatriados ou deixaram nosso país.

Infelizmente não há mais nada para eu fazer aqui, mas eu vou continuar amando os franceses e este público com os quais dividi tantas emoções!
Eu parto pois vocês consideram que o sucesso, a criatividade, o talento, na verdade, a diferença, devem ser punidos.

Eu não peço para que me aprove, mas eu poderia ao menos ser respeitado!

Todos aqueles que deixaram a França não foram desrespeitados como eu fui.

Eu não preciso justificar as razões da minha escolha, que são muitas e são íntimas.

Eu parto após ter pago, em 2012, 85% de imposto sobre minha renda. Mas eu mantenho o espírito desta França que era bela e que, eu espero, continuará assim.

Eu lhe devolvo meu passaporte e minha Previdência Social, que nunca me serviram para nada. Nos não temos mais a mesma pátria, sou um verdadeiro Europeu, um cidadão do mundo, como meu pai sempre me incutiu.

Acho patético o ataque da justiça contra meu filho Guillaume julgado por juízes que o condenaram a três anos de prisão em regime fechado por duas gramas de heroína, quando tantos outros escapam da prisão por atos muito mais graves.

Não jogo pedras em todos aquels que tem colesterol alto, hipertensão, diabetes, consomem muito álcool, ou que dormem em seu scooter: sou um deles, como a sua querida mídia gosta tanto de repetir.

Nunca matei ninguém, não acho que tenho deméritos, paguei 145 milhões de euros em impostos em quarenta e cinco anos e empreguei 80 pessoas nas empresas que foram criadas para elas e que são geridas por elas.

Não devem sentir pena de mim nem devo ser louvado, mas recuso a palavra "patético".

Quem é você para me julgar assim, lhe pergunto senhor Ayrault, Primeiro ministro do senhor Hollande, lhe pergunto quem é você? Apesar dos meus excessos, meu apetite e meu amor pela vida, sou um ser livre, senhor, e vou continuar educado.
 
Gérard Depardieu

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