28.3.13

Quando um "projeto comercial" era o Rockefeller Center

Arquitetura comercial é uma das palavras mais abominadas no meio arquitetônico acadêmico. Para mim, o motivo surge já que, para uma determinada construção ser economicamente viável no Brasil primeiro há enormes custos envolvidos com a adaptação à regras urbanas - normalmente destrutivas - como vagas mínimas de garagem, afastamentos obrigatórios, contabilidade de áreas construídas seguindo critérios questionáveis, leis de zoneamento, entre outras. Além disso, o risco envolvido com mudanças de regras locais, o enorme poder decisório político em toda construção e as incertezas em relação ao financiamento da obra tornam o foco qualquer incorporador muito além do campo arquitetônico e construtivo.

No entanto, houve um momento e lugar em que as coisas não eram assim: a Manhattan da década de 20. Lá, logo no estouro da crise financeira de 1929 surge o empreendimento Rockefeller Center, empreendido por John D. Rockfeller Jr., filho de provavelmente um dos empresários mais famosos da humanidade que, após se comprometer com o investimento, mudou o programa original de uma sede para a Metropolitan Opera para...
"o máximo de congestão com o máximo de luz e espaço" e "Qualquer planejamento [...] deveria se basear num 'centro comercial o mais belo possível em consonância com o máximo rendimento a ser gerado'".
O programa do Rockefeller Center consiste em conciliar essas incompatibilidades. 
Uma inédita aliança de talentos trabalha nesse empreendimento, insólita por seu tamanho e variedade. Como descreve Raymond Hood: "Seria impossível calcular o número oficial de cabeças empenhadas em destrinçar as complexidades do problema; e certamente o número extraoficial de cabeças que ponderaram o tema seria um palpite ainda mais descabido". 
O Rockefeller Center é uma obra prima sem um gênio.  
Como não há um responsável individual pela criação de sua forma definitiva, a concepção, o nascimento e a realidade do Rockfeller Center têm sido interpretados - dentro do sistema tradicional de avaliação arquitetônica - como uma complexa situação de compromisso,  um exemplo de "arquitetura de comitê". 
Mas a arquitetura de Manhattan não pode ser medida por instrumentos convencionais; eles são resultados absurdos: ver o Rockefeller Center como uma solução de compromisso é indicação de cegueira. 
A essência e a força de Manhattan residem no fato de que toda a sua arquitetura é "de comitê", e de que o comitê é formado pelos próprios moradores de Manhattan.

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O Rockfeller Center, idealizado com o mesmo espírito de devoção estética, é concebido para satisfazer, no padrão e no serviço, ao espírito multifacetado de nossa civilização. Resolvendo seus vários problemas, estabelecendo uma relação mais íntima entre a beleza e os negócios, ele promete ser uma contribuição significativa para o planejamento urbano de um futuro que desabrocha. 

Assim o arquiteto e urbanista Rem Koolhaas descreve o projeto em seu livro "Nova York Delirante". Um projeto comercial em essência, criou como forma de valorizar seu metro quadrado construído um dos espaços públicos mais fantásticos da cidade: sempre movimentado, com espaços para sentar, atividades para participar, críticas sendo manifestadas, shows e arte para olhar e, como não poderia faltar, lojas para comprar. Para completar, o projeto inaugurou um dos primeiros telhados verdes em edifícios na Manhattan moderna.

No início do século a cidade esbanjava liberdade construtiva, tornando o único diferencial entre construtores justamente a qualidade e a eficiência de sua obra: sem politicagem, já que políticos pouco mandavam. Para Koolhaas, o Rockefeller Center é o ápice do boom construtivo do início do século que chega à "Manhattan definitiva". O projeto é comercial no sentido mais puro da palavra que, como descreve o trecho do livro, tem todos os moradores de Manhattan como críticos da qualidade do trabalho: verdadeiros consumidores em um mercado de arquitetura.

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