23.4.12

Com o trânsito piorando nas cidades brasileiras, oficiais planejam para mais carros / As Traffic Snarls Brazil's Cities, Officials Plan For More Cars

O urbanista norte americano Stephen Smith escreveu um excelente artigo sobre a regulamentação urbana brasileira voltada para o trânsito, exigindo vagas de estacionamento para todas novavs obras. Depois de ajudá-lo com alguns dados, disponibilizo aqui o artigo traduzido na íntegra.

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American urbanist Stephen Smith wrote an excellent article on brazilian urban regulation towards traffic, demanding parking spaces for every new building. After helping him with some data, I leave you with the complete translated version.

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O trânsito nas cidades brasileiras tornou-se intolerável, mas regras de
planejamento ainda requerem que construtoras criem espaço para mais
carros.
Dizer que São Paulo tem muito trânsito não seria o suficiente. Cheia de congestionamentos, seus cidadãos já estão tomando o espaço aéreo, fazendo com que a frota de helicópteros de São Paulo já seja a maior do mundo. Mas para os paulistas que não podem ir aos céus todas as manhãs, soluções para o problema no chão são urgentemente necessárias.

Além de melhoras nos sistemas de transporte em massa, ambientalistas e urbanistas sugeriram algo bem menos atrativo: que se pare de forçar as construtoras de terem de criar estacionamentos para carros que as ruas da cidade não conseguem suportar.

Algumas décadas atrás o Brasil se uniu à nações em desenvolvimento na adoção do estilo americano de requerer um mínimo de vagas de estacionamento em novas construções, mesmo com esse sistema de "vagas mínimas" já estar perdendo valor nos Estados Unidos. Enquanto planejadores urbanos procuram ter certeza de que todos que têm um carro também tenham um lugar para estacioná-lo, os críticos argumentam que ao invés de somente criar espaço para aqueles que vão inevitavelmente dirigir, as regulamentações estão ativamente incentivando a motorização. Os esforços de reformistas produziram alguns sinais de mudança, mas o caminho para reverter às formas pós-guerra de planejamento do Brasil pode ser tão duro quanto enfrentar um congestionamento em São Paulo.

O fato de que as cidades brasileiras possuem regulamentação sobre o uso da terra pode ser chocante para alguns. As favelas são as construções mais familiares aos estrangeiros, e de fato elas existem fora do poder de alcance dos planos diretores das cidades, junto de muitas casas de famílias de classe média que são construídas nas periferias das cidades. Mas para as mais acessíveis e valorizadas propriedades nos redores do centro da cidade, códigos de zoneamento e regulamentações sobre as construções são bem impostos nas cidades brasileiras.

O Brasil tem uma história de planejamento urbano rígido que data de mais de 50 anos atrás com a capital planejada Brasília, que teve sua construção iniciada nos anos 50, sendo o exemplo mais proeminente. Projetada no auge da teoria modernista de planejamento, ela evita os problemas de outras cidades em relação ao seu trânsito de carros e pedestres. A cidade foi originalmente concebida pelo chefe de planejamento Lucio Costa como sendo sem calçadas ou semáforos nas principais avenidas, fato que, junto da abundância de intersecções em trevo, demonstra o favorecimento dos planejadores ao transporte motor sobre qualquer outro.

Ao contrário de Brasília, São Paulo não foi construída a partir do zero por planejadores, mas ainda assim possui uma grande gama de diretrizes para construção. Todas normas que costumamos ver estão nessas diretrizes - limites nos tamanhos verticais e horizontais de construções, por exemplo - junto de algumas outras que nem existem nos Estados Unidos, como a obrigatoriedade de elevadores de segurança contra incêndios em prédios muito altos.

Edifício Esther, construído em 1938 no Centro de São Paulo foi o primeiro
grande edifício com uma garagem própria. 
Uma das diretrizes urbanas que as cidades brasileiras compartilham com as americanas é a de requisitos mínimos de vagas de estacionamento. Em São Paulo, o requisito é de geralmente uma vaga de estacionamento por apartamento em conjuntos residenciais e uma vaga para cada 35 metros quadrados em locais comerciais. Com uma vaga a cada 35 metros quadrados, os requisitos nos locais comerciais são menores do que aqueles de muitos subúrbios norte americanos, onde não é incomum encontrarmos requisitos de uma vaga para cada 19 metros quadrados. Mas, para um centro urbano denso que serve uma população em sua maioria sem carro, muitos acreditam que os requisitos são prejudiciais ao crescimento.

Mesmo com a reputação brasileira de ser um país de cidades orientadas para o automóvel, Alejandra Devecchi, gerente de projetos e urbanista ambiental na empresa internacional de engenharia e arquitetura AECOM, diz que a grande maioria dos deslocamentos não é feito com veículos motorizados individuais. Na região metropolitana da Grande São Paulo, onde residem 20 milhões de pessoas e que tem a rede de transporte coletivo mais extensa do país, somente 30% de todas as viagens são feitas com automóveis particulares. No entanto, Devecchi observa, "nós podemos ver facilmente que muito do espaço público é projetado para automóveis, passando os custos para o público em geral", já que o paulista médio não tem carro.

As construtoras residenciais de São Paulo - ao menos aquelas operando de acordo com o que diz o plano de planejamento da cidade - tendem a construir somente para os ricos, que iriam querer bastante vagas de estacionamento mesmo que não houvesse a regulamentação, mas os construtores menores muitas têm vezes seus projetos frustrados por exigências da cidade de vagas de estacionamento. Uma desenvolvedora de espaços comerciais paulista, que prefere ficar anônima pois ela não tinha autorização para falar sobre isso publicamente, disse que é comum que shoppings recentemente construídos possuam tanto espaço dedicado para o estacionamento quanto área bruta para locação.

Ao ser perguntada se ela e seus colegas estavam de acordo em ter que criar tantos estacionamentos, ela respondeu, "Não, não estamos felizes em termos que fazer isso, mas é assim que as coisas são. Esse é o 'status quo' e ninguém o questiona".

E as diretrizes não são sempre previsíveis. Grandes projetos em São Paulo, classificados como "centro geradores de tráfego" estão sob jurisdição da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que tem o poder de analisar projetos individualmente e sob sua discrição ignorar as necessidades de estacionamento que constam no estatuto, normalmente dizendo ser necessário mais estacionamento do que o padrão de necessidade dos projetos menores.

Uma das explicações normalmente dadas para o mínimo de vagas de estacionamento no Brasil é que, ao contrário das grandes cidades das nações desenvolvidas, a infraestrutura de trânsito em cidades brasileiras deixa muito a desejar. E, enquanto é verdade que São Paulo não tem a capacidade de acomodar o trânsito como, por exemplo, Nova Iorque, as decisões do uso da terra ainda dependem dos investimentos em transporte que são feitos.

Shoppings adjacentes a estações de metrô com tantos andares subterrâneos de estacionamento quanto há andares de espaço para locação acima da terra não são incomuns em São Paulo, e cidades menores não estão imunes a isso. A cidade de Curitiba, no Sul do Brasil, por exemplo, foi pioneira no que agora conhecemos como "Transporte Rápido por Ônibus" (sigla BRT, em inglês), onde pistas dedicadas e sistemas de tarifa pré-pagos permitem que o serviço seja mais rápido e confiável do que aquele onde ônibus se misturam com o tráfego comum, e tudo isso sem o investimento pesado necessário de uma malha ferroviária.

O sistema obteve bastante sucesso em atrair curitibanos para o trânsito e foi emulado por todo o mundo mas, como percebido por Christopher Ziemann em sua pesquisa em Curitiba em 2005, as regulamentações não for atualizadas para refletir essa melhora na rede de trânsito. Ziemann diz: "Curitiba adotou tamanhos mínimos de estacionamentos similares ao da maioria das cidades dos EUA, mesmo com as linhas BRT."

Existem, contudo, sinais de que mudanças podem estar se aproximando. Num estudo completado em 2001 sobre a evolução dos estacionamentos relativo ao tamanho das construções na maior cidade do Brasil, Hamilton de França Leite Jr. e seus colegas da USP descobriram que a proporção do espaço dedicado a estacionamento teve seu pico em 2001, quando para cada dois metros quadrados de apartamentos construídos, um metro quadrado de estacionamento era incluso. Os pesquisadores descobriram que a quantia de estacionamento caiu levemente até o meio da década, mas que depois de 2006 ela voltou a crescer.

E, enquanto muitos urbanistas e arquitetos dizem que não viram mudanças, uma construtora de shoppings disse que, pela primeira vez em 15 anos construindo na cidade, a Companhia de Engenharia de Tráfego deu uma aliviada na exigência de estacionamentos. Mas quando perguntada se ela pensava que isso seria uma tendência duradoura, ela hesita ao responder, dizendo que "ainda é muito cedo para dizer se as coisas estão definitivamente mudando".

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